quinta-feira, 28 de maio de 2009

O Beco das Calçolas

A pauta foi na travessa Dom João I, bem mais conhecida como 'Beco das Calçolas'. Fica no bairro Getimana, aqui mesmo em Aracaju.

Como já era de se esperar, o nome surgiu de uma historinha esquisita. O tal do beco é bem num morro. Daqueles que quando chove é um ‘Deus nos acuda’. Há algum tempo, estando nele e olhando para cima, o cidadão logo via os quintais de várias casas. Todas sem cercas ou qualquer outra coisa que preservasse a privacidade dos moradores.

Nesses quintais era comum ver as mulheres das casas desfilarem suas peças íntimas à vontade, certas de que estavam longe dos olhares alheios. Pobres coitadas, mal sabiam que lá embaixo sempre tinha um malandro pensando (ou fazendo) besteira.

Aí a fama pegou. Um tempinho livre e a macharada já ia ao beco ver as ‘muié’ de ‘caçola’.

Hoje nem dá mais. É que as casas estão muradas. Ao menos algumas delas. As outras não agüentaram o pau d’água, escorregaram na ladeira e caíram bem no beco. Foi o que me levou até a região. Fui ouvir o drama dos calçolenses, que tanto sofrem em tempos de chuva.

No bequinho mora uma gente humilde, sofrida, que não teve muita oportunidade na vida. Alguns debandaram para onde não se deve: foram vender drogas, roubar ou até matar. Por isso às vezes vemos na TV ou nos impressos algumas notícias que citam o local. Normalmente é bandido se escondendo ou casa derrapando.

E em todos os casos ficava a dúvida com relação ao porquê da calçola. Agora ta explicado.


Foto: Alejandro Zambrana

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Pra quem gosta de apostar

Itabaiana é uma terra de grande valor para o estado de Sergipe mais conhecida pelo seu comércio pujante e pela grande quantidade de caminhoneiros e seus respectivos caminhões. Está seguramente entre os três mais importantes municípios do interior, seja por sua economia, quantidade de habitantes ou consumo de cebolas.

Mas algo talvez não tão falado (ou vai ver eu que ando desinformado) sobre esta querida cidade, está na criatividade de seu povo quando o assunto é ‘apostas’.

Se você é um cara de sorte, mora nos cafundó do brejo e quer subir na vida, ter boas condições financeiras e desfrutar de um monte de coisas caras, dá uma passada em Itabaiana. ‘Qui mané’ tentar a sorte na cidade grande! Enfiar a cara nos livros, dá um duro danado e no final das contas correr um sério risco de ficar desempregado?! Faz isso não. Vai pra Itabaiana que o negócio anda mais rápido.

Deixa-me discorrer sobre o assunto. Lá, onde quer que você vá, vai ter alguém apostando em algo. E num estou falando em loteria nem jogo do bicho não. Claro que tem também, mas esses se vê em todo lugar. Em Itacity a onda é apostar diferente.

E variedade é o que não falta. Num barzinho com som 'ao vivo', o cantor faz seu show quando de repente já tem um gritando: “Ganhei! Ganhei!”. O birita reuniu-se com os colegas de mesa e cada um escolheu uma música. Como a dele saiu primeiro, ganhou. Pior é pro cantor: tem que mudar ao menos a ordem das músicas a cada apresentação.

Se a pedida é um jogo de futebol, é de se imaginar que as apostas vão estar entre três opções: no que vai ganhar, no que vai perder ou no empate. Em Itabaiana não. As apostas são as mais improváveis e inimagináveis. Ali é mais interessante depositar a sorte em quem vai sofrer a primeira falta ou em quem vai cabecear a cobrança de escanteio. Desse jeito aumentam o prêmio e as opções de aposta.

Há casos e mais casos. Bingo, por exemplo, tem em todo boteco. É até mais fácil não ter cerveja. Outro caso bastante comum acontece sempre no Centro da cidade. Na falta de clientes, alguns funcionários em frente a alguma loja batem um papinho sobre algum assunto enquanto não param de olhar para a esquina mais próxima. Se você é de fora num vai entender é nada. Agora se você é da terra já deduz ‘de cara’: a aposta é na cor do primeiro carro que aparecer!


A gente vai escrever sobre determinado tema, aí resolve inteirar-se sobre, e às vezes vê cada coisa... Ao que parece não há um senso comum sobre a origem do nome Itabaiana. Também não me interessa chegar a esse ponto. Mas uma das teorias é bem curiosa. Engraçada até.

Na época da colonização, tinha uma índiazinha toda jeitosa chamada Ita. Ita era baiana, mas fez sucesso mesmo foi naquela terrinha sem nome. Tão sem nome que inventaram de homenagear a forasteira.

Ita já gostava de remexer as cadeiras. E os marmanjos já gostavam de ver a cena. Reza a lenda que era um fuzuê danado. Era tanto que quando Ita começava a dançar só se ouvia o clamor popular: "Ita, a baiana!" "Ita, a baiana!" Só não sei se apostavam na dancinha da vez.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Uma de Silvio Rocha

O fotógrafo Silvio Rocha é a alegria das tardes na redação. Pra tudo tem uma piada. Se não tem, improvisa. Às vezes nem é piada, mas do jeito que ele conta todo mundo ri. Rir e fazer rir são com ele mesmo.

Quando chega já é mostrando os dentes. Blusa de botão, calça jeans, sapato social, o visual é basicamente igual. Estatura elevada, passadas largas. “É uma luta”, diz logo que chega. Logo que sai também; quando fala com alguém de passagem; quando atende uma ligação... “É uma luta” pra tudo que é lado. Não há como ouvir isso e não lembrar dele.

Silvio é cantor também. E dos bons. Tem CD gravado, ta sempre fazendo show, foi até personagem de um especial de TV sobre artistas locais. Mais do que justo, afinal é um ferrenho defensor dos sons da terra. Grupo local gravando em inglês? Pergunta o que ele acha disso. Vira e mexe Silvio ainda arruma tempo pra compor. De vez em quando até concilia as coisas: é tirando foto e compondo e cantando.

Mas vamos ao que motivou o texto. Dia desses Silvio passou por uma que ele não vai esquecer tão cedo – e olha que a memória não é seu forte. Na verdade mais uma entre tantas outras nessa vida muito bem vivida. A diferença é que eu tava perto e vi – e ouvi também.

Há dias seu carro estava sujo. Queria lavar, mas não encontrava tempo. Há dias pensava numa alternativa. Eis que na redação um certo funcionário aparece com a solução: “leva lá no meu postinho”. O cara agora é ‘pequenomicroempresário’. Dono de postinho de lavagem. Tem até um nome bonitinho ó: “Autobrilho”.

Mas a encomenda saiu melhor que a pedida. “Pra colega de trabalho tem desconto: é R$20, mas eu faço por R$10 e ainda levo o carro”. Pronto, ta resolvido o problema. “O pessoal é bom: tudo lavador de primeira. Os produtos são tudo de primeira também”, diz – na verdade até a lavagem seria a primeira.

“Vixe Silvio, dezinho só! Se deu bem”, comento com ele. “Ei rapaz, dezão. Valoriza aí”, responde logo todo risonho. To dizendo que o cara tem piada pra tudo.

As horas passam no trabalho. Tranqüilo Silvio aguarda seu já cansado Peugeot 206 vermelho ano 2000 vir todo limpinho. É só lembrar que chega dá vontade de sair. “Ah, hoje tenho que arrumar um lugar pra ir”. Nem imaginava o que estava por vir.

Eis que o celular toca. “Rapaz, lascou tudo: o carro num quer ligar mais não”. Alguém direto do Autobrilho. “Já tentei de tudo aqui e num tem jeito”.

Silvio Rocha inverte a feição. Joga fora o sorriso e fica todo perdido. É hora de raciocinar. Tentar deduzir o que se passa. E tome-lhe achismo. “Acho que molharam onde não se deve e algo pifou”. Na redação alguém dá a dica: “se queimar de segunda acho que pega Silvio”.

Pega nada. Coitado de Silvio: de uma pechincha, caiu numa bronca das brabas. Conversa vai, conversa vem (pulando um monte de parte sem graça), só um técnico encontra a solução: queimou uma peça que não tem em canto nenhum. E o pior é que pra encomendar é quase o preço do carro.

E aí? E aí que se fosse com qualquer outro o mundo tava acabado. Mas o homem é popular. Aí a história é outra. Não sei lá como, o filho de Deus descobre que em um povoado próximo a Umbaúba – uma cidadezinha a 100 quilômetros da capital conhecida sobretudo por ser a segunda a ser encontrada quando se entra no estado de Sergipe pelo sul, ufa! – tem um senhor que tem a peça!

Silvio vai buscar e problema resolvido. Não sem uma despesinha de leve. Negociou, pechinchou, parcelou e taí o carro andando. Só não tinha mais (ou mais uma vez) onde ser lavado.

Mas logo Silvio encontra uma alternativa. Também em conta, mas de qualidade, no mínimo, questionável. Em frente à Prefeitura – seu ambiente de trabalho – um figura aproveita os carros estacionados e dá um jeitinho ali mesmo. Silvio já sabia disso, mas num dava muita bola. É que o sujeito usa apenas um balde de água para cada carro. Pode ta sujo como for, o bicho faz milagres.

O preço? Bem, começou cobrando R$5. Mas aí lá vem Silvio inventar de virar cliente e começar a divulgar. Logo ele, que conhece gente em tudo que é canto – coisa de artista né. Como se não bastasse ainda inventa um nome: ‘Baixobrilho’, em homenagem, é claro, à sua última experiência com postos de lavagem. Então: agora o carinha não faz por menos de R$7. Seu cliente número um? Silvio Rocha. Toda sexta-feira à tarde o Peugeot ta lá. É só passar e ver.