terça-feira, 9 de junho de 2009

Licor da Gabriela

Enquanto a Gabriela de Jorge Amado vira filme e ganha o mundo, um certo licor conquista o aracajuano. Feito de cravo e canela, quem prova gosta, e quem gosta recomenda. Assim vira febre por toda a cidade, sobretudo no período junino. O nome não custa a aparecer e vem ‘da boca do povo'. O primeiro a falar ninguém sabe, mas o que ele disse não se esquece: "Traz uma Gabriela!". Ligaram uma coisa à outra e assim nasceu a ilustre bebida.

"Quem batizou foi o povo", diz Carlos Henrique de Oliveira Santana, 58, há um bom tempo conhecido como ‘Henrique da Gabriela'. É ele quem toca adiante a tradição familiar de produzir licores. Tradição que teve início ainda no século XIX. "Começou com meu avô, em 1880, mas ele só fazia para a família ou para dar de presente". Do avô para o pai, do pai para Henrique, que aprendeu a arte ainda menino. "Comecei cedo, ajudando, e hoje mantenho a tradição", conta.

Há várias gerações a família mora no mesmo lugar: rua Rafael de Aguiar, número 375. Uma espécie de residência multifuncional. Lá ele fabrica o ‘Gabriela', mantém um barzinho e ainda um pequeno espaço cultural, onde promove apresentações de grupos folclóricos, saraus poéticos, encontros de repentistas e cordelistas, entre outros eventos. Isso sem falar no Forró da Gabriela, que há 10 anos junta todo esse pessoal numa justa celebração à cultura sergipana.

No hall de entrada as paredes mais parecem extensos murais, repletos de peças que remetem à história da família criadora do famoso licor. De um lado, objetos feitos pelo avô de Henrique, que era ferreiro; de outro, vários certificados de participações em eventos ligados à cultura nordestina; mais no canto, uma coleção de vinis e uma velha radiola. Algumas molduras com recortes de jornais trazendo matérias sobre o Gabriela completam o cenário.

Simpático, receptivo e sempre sorridente, Henrique da Gabriela não cansa de contar sua história. Lembra que iniciou a comercialização do licor no final dos anos 80, quando ficou desempregado. "Aí montei o barzinho e comecei a vender", lembra. Os sabores ainda eram poucos. "No início só tinha de jenipapo e o de cravo e canela". Mas a criatividade do sergipano logo fez a diferença. Hoje são mais de 70 sabores e quatro mil litros de licor produzidos por ano. Alguns preparados em edições especiais, com rótulos de acordo os eventos para os quais foram feitos.

Cada licor tem um tratamento especial, seja no jeito de cortar a fruta ou no tempo de conserva. "A jabuticaba, por exemplo, tem que amassar bastante antes de mergulhar na cachaça. Já a banana não precisa, basta pôr direto para absorver o líquido", explica Henrique. No fundo de sua residência, vários galões guardam o ‘Gabriela', em seus mais variados sabores. As bebidas ficam ali, estocadas, cada uma com a fruta que lhe dá sabor mergulhada na cachaça até a hora de pôr nas garrafas.

Os nomes são curiosos. Vão de ‘viagrinha' a ‘lágrima', passando por ‘xixi das virgens' até chegar ao novo ‘licor da mudança'. Todos, é claro, levam a marca ‘Gabriela'. "A gente cria de acordo com o que vemos no dia-a-dia, nas coisas do nosso povo", revela. E como seu Henrique já viajou todo o país divulgando Sergipe com seu licor, já conhece os costumes de tudo quanto é gente. "No Sul o pessoal tem o hábito de recepcionar as visitas com um licorzinho", conta.

Normalmente dois funcionários auxiliam Henrique na produção. "Agora em junho a procura aumenta, aí vão ser uns quatro". Com a chegada do período junino fica mais fácil encontrar ‘Gabriela' em todos os cantos de Aracaju. Para reconhecer é fácil, nem precisa ler o rótulo. Basta ver um chapeuzinho de palha vestindo a rolha. "A marca da ‘Gabriela' é o chapéu", comenta Henrique, que também não tira seu chapéu pra nada.

Texto produzido para o hotsite do ForróCaju 2009

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